segunda-feira, 2 de outubro de 2023

 

Javali, javari, jauari

 

Estava eu dentro daquela construção onde passei a infância no sertão, usina velha, lidava com algodão... Entre destroços, alvenaria antiga e uma selva erguida. De repente surge um javali grande, destes mágicos que falam e a gente entende. E depois de dizer uma porção de coisas sérias sobre vida, corpo, território, presença, destino; me desafiou na força.  Olhou fixamente e veio até mim em carreira, abocanhou-me a orelha esquerda, babando os cabelos. E sabendo eu que era necessário estar imóvel, com perigo de partes contidas na boca do bicho, mágico, que me ensinava algo. Algo de sobrevivência e luta, e algo além. Algo sagrado, porem palpável, talvez não capaz de segurar. Algo vermelho terra, como um sopro quente além da raiz; algo ancestral da feitura das gentes de carne, essas que passamos a ser, e ao pouco também fomos esquecendo que somos.

Encontrei um rio e uma luta de cá, e um milagre na Índia. Aos poucos vou desvendando os símbolos que despertam quando durmo, que dormem quando desperto, que despertam.

Na casa de vó Regina, um portal, e vozes que aconteciam, vozes de bruxas antigas, como num rádio antigo pegando frequências mortas. - Não as escute, melhor você não fazer o que elas querem – eu temia esse desconhecido feminino que não podia ver ou ouvir, mais do que temia o Javali que me atacava.

Em outro ambiente grandes torres vazadas, pálidas, piramidais. Danças modernas, hipnóticas, vampirescas. Quis sair daquele lugar. Descia rapidamente as galerias, brancas, pálidas. Algo mediterrâneo. Aldo desértico. Propaganda de malboro. Pessoas alienadas, ou apenas festivas. Elas não sabem que logo serão mordidas, sugadas... tudo muito perigoso nessa região da mente do Arizona, Novo México, ou sertão.

sexta-feira, 10 de março de 2023

E de repente, mais que de repente
Uma gama de bundas na tela
E ora é por liberdade
Ora a liberdade encerra
Perfis guiados pelo gosto macho
Uma pós pornografia
O cotidiano expandido é tão pequeno
Cabe na palma da mão
Numa subvida, tela
Corpos isso
Corpos aquilo
Que corpo cabe ou não
A mulher assim assada
A assada, e sim, assim
O que cabe de repente
E de repente todes assim
Sensualizandi 
Vendendi 
Na lingua do jobs 
Me curte, me segue,
Não me julga
Me come, me bebe, me expurga
Tudo isso pela tela...
Vulva livre
Ventre livre
Guenga Power
Bundas muitas que se movem
Que se espalhem...
Umas tem cara, outras não
Umas tem cílios postiços
Outras na make padrão
Uma a vibe natural
"Sem filtro" é a descrição 
Umas muitus seguidores
Outras nem tanto, perdão
Umas de Yoga, de Yone,
Outras vão dançando bem
Umas cantigas bem toscas
Outras com música zen
Boom expressivo de bumdas
Fotos de bustos, de pélvis 
De barriguinhas "saradas"
Dançando hula com o Elvis
Quase todas no padrão 
Ratas de academia
Ou esportistas então 
Fotos de pratos tão fitnes
Nada pode a contramão 
Ou mostrar o que desejam 
Ou afrontar o refrão
Polifonia, será?
Tudo explícito, será?
Tanto não dito a falar
Tanta verve pelo chão
Entre a tese e antítese...
Terá síntese, ou não?...
Tanta gente triste à p0rr4
Mas vamos conectar
Fazer a foto mais top
Fazer a cara mais sexy
Fazer a dança da vez
Bora simbora expressar
Fazer o verso não dito
Dizer o que já tá dito
Se repetir outra vez
Chegou a hora e a vez
E a gente fora da caixa
Dizendo pro telefone
Tentando a rima que encaixa
Na força que nos socorre 
E já não é telefone
Inovação que incorre
Outra tecnologia
N"algo que é quase o mesmo
Mas sempre um algo "Algo mais"
Pra sobrepor o modelo
Que tanto tanto quis tê-lo
Mas que logo obsoleto 
Ultrapassou, jaz e trás 
Quem dá mais, é quem dá mais
E logo vem outrx top
E suplanta tudo tudo
Pra breve ser suplantado
Artifícios descartáveis 
Tão necessários agora
Quem não tem 
Nem gente é












terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

cinza

Cinzas também revivem
É estranho, mas acontece...
Na força das alegorias
Na fé do ressuscitado 
Nas vozes ancestrais

Cinzas nas nuvens
Renascendo verdes solos
Cinza do cimento
Que a gente quebra
Colore
A cinza da brasa
Que assou o milho
Que esquentou o corpo

Mistério dos olhos cinzas
Cinzelando o tempo
Que por trás dos olhos
Mar cinzel de desmemórias 

Cinza a ave, a mãe das aves
A harpia dos ares
Do tamanho da nuvem
Sombreando cinza
O sopro do bote

A coruja cinza
Amiga dos sinos
Numa tarde cinza
De Egito 

Entre os palmaeirais 
Sob um sarcófago
A cinzenta pele
Da múmia 

Cinza, cinza, cinza
Como a brisa em breve
Ou vento de chuva
Cinza que lhe rege

terça-feira, 7 de junho de 2022

Marcolina

Mamãe véia Marcolina
Kariri Xocó, Pipipã...
do povo das Macambiras
Avó véia, anciã
avó da minha avó Rita
Que resistiu nesse tempo
Raiz da terra da lua
Que minha mãe cultivou
Em mim a semente crua
Do povo da Macambira
Mãe vô veia, Marcolina
Vem de pedra colorida
De karuá, de imbira
Tintura de aroeira
Avó trisavavó guerreira
Inscrita na cacheira
Adorando uma palmeira
Acocorada à cadeira
Mãe veia, minha avó véia
Teu sangue na minha veia
Me deixa te encontrar
No ventre na lua cheia
Aqui, em qualquer lugar
Na minha mãe, na madeira
No trancados da esteira
Na rede, no balançar
No ato de amamentar
No milho bom de plantar
Nesse mês que mês de chuva
No tempo, no não lugar
E Pai Elói que é teu filho
Pai velho, meu bisavô
Me dê a benção de fogo
Meu avô véio, vovô 

segunda-feira, 23 de maio de 2022

enfrentamento cordel

Na nossa sociedade
dentre os grupos oprimidos
a mulher tem um destaque
importante a ser sabido
são elas quem sofrem mais
e o intento desses Ais
precisa ser resolvido

Esses queixumes reais
são diversos e oportunos
uma luta com muitas frentes
com objetivos unos
promover a igualdade
respeito a diversidade
pra refazer esses rumos

As violências são muitas
que aqui vamos elencar
mas tem umas principais
que é importante citar
fiquem atentes, anotem
para poder recordar:

Física e psicológica
moral e sexual
também outra violência
é patrimonial
e todas essas porem
podem vir juntas também
são faces e um mesmo mal

A lei reconhece 5
dos tipos de violência
e encontrando essa lógica
dos que tem mais prevalência
aquelas que de tão drásticas
querem tirar nossa essência

Mas são muitas violências
é diverso o patamar
tem alguma que cês lembram,
para poder elencar?...
Eu me recordo de uma
que é importante citar

A violência política
vemos muito por aí
mulheres que são eleitas
muitos buscando impedir
vejam Dilma, Marielle...
o que sofreram na pele
difícil de engolir

Essas violências todas
não são casos isolados
infelizmente esses casos
são cotidianizados
pela cultura machista
e o triste patriarcado

Somas de outras violências
Também a tantas ocorre
e múltiplos feminismos
da experiência decorrem
movimentos específicos
pelas mulheres incorrem

A lei a todas socorre
ou devia socorrer
a questão é que os entraves
culturais que a gente vê
atrasam essas demandas
do que a lei nos prevê

Quando se é negra ou indígena
Mulher cigana, ou sem teto,
vinda de comunidade,
tratada como objeto,
mulher lésbica ou trans,
algo fora dos padrões
do normativo espectro

O Estado também promove
violência contra a gente
a violência obstétrica
é um assunto presente
coerção policial
e a violência estatal
vem até do presidente

Quando a gente elege alguém
que exerce a misoginia
que tem o ódio as mulheres
de uma forma doentia
é provável que nos queiram
tirar direitos um dia

E é fato esse bilhete
tem exemplos por aqui
quando a extrema direita
passou a nos presidir
sempre querendo criar
formas de nos deletar
modos de nos destruir

"Jogo das identidades"
por lá é utilizado
mulheres anti-mulheres
são fantoches do Estado
e umas ministras sinistras
a enganar nossas vistas
são braços manipulados

São necessárias políticas
Que empoderem de fato
Que estejamos em cena
criando o nosso ato
Que possamos ocupar
Aqui e todo lugar
Sem veto nem desacato

A Lei Maria da Penha
foi uma grande conquista
mulher que quase foi morta
que se tornou ativista
pela vida das mulheres
por força que nos assista

Outras tantas são exemplos
Das lutas cotidianas
E as heroínas da pátria
Titulações soberanas
Dão luz à grandes mulheres
De lutas que se irmanam

Professoras, cientistas,
Compositoras, arteiras
Obstetras e parteiras
Mães, guerreiras e artistas
Tantas das vezes mal vistas
Queriam elas caladas
Com sua força ofuscada
Mas foram protagonistas

Na poesia de cordel
Contei de modo geral
O que limita as mulheres
E a raiz desse mal
Que a gente possa lograr
De um tempo mais igual



domingo, 12 de dezembro de 2021

ancestrais de escamas?

Serpenteando um eu profundo
As ancestrais gigantes me encontram
Renascer-me em cada fênix
Soltando os molambos
Muambas magicas pra enganar a morte
A tristeza do esquecimento

Mente que vagueia parece chegar

Os pés quase descalsos
De quem vibra em circundar abismos
Algo vivaz
Uma vontade de queimar
De ser cavalo livre

Onde, misteriosamente, as pedras
resgardam um cão sem plumas
Animal tão misto
Quase sagrado
Na pureza e sorte dos loucos, do encantados
Na experiência dos que comeram pedras
Pra ajudar a digerir os olhos
enviesados da civilização

Deus hoje proteje os que sonham?
Exu tamborila aboios
No latão do meio fio
Virando fumaça
Nas encruzilhadas

Ei os de amor

Algo de bonito
nesse passarinho dinossauro
Acheopterix da matriz
Os simulacros rasos, raros
"Da simultaneidade de mundos"
Com diria mãe Aparecida de Oxum

sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

chuva chamamento

Uma vez eu senti um chamamento
Era a chuva
parecia ouvir meu nome nas telhas
Descendo pelo metal das grades
Escorrendo na relva
Sugada pela terra

Tempos alucinados em que me ouvia na chuva
Em que a chuva falava na voz dos demônios
Em que os espíritos me acordavam no meio da noite
Na voz dos parentes, na voz dos mortos

A voz da chuva chia como um miado de areia
Quando nos permitimos a paz molhada
e os escombros não nos ferem a alma
rasgando o  linho

Ainda existe voz na chama
da voz amarela de Oxum
Tilintando os latões das calhas
entre espelhos de Orixá

Arrasta as folhas,
Abre sulcos
Lava

É mestra em amolecer durezas
penetrar certezas
Esborrar represas

É na voz da chuva
Que a sabedoria goteja
Fresquinha
No tempo morno
E evapora
Na sorte de um vôo

Suga pro centro da Terra
Voa no calor do milagre

Na sabedoria da chuva
A planta se enlaça
É cipó

No mini mistério da fruta doce
Do dia magma
Na sabedoria da chuva
Que se faz  mormaço
Que mãe diz que adoece

Água que aquece
Peito morno vento

Chama calma, 
chuva e amento




sexta-feira, 19 de março de 2021

enquanto não chega o mote a gente vai só sentindo

Anaíra - 

Um abafado no espaço 
Na natureza mistura
A gente faz a costura
Mexendo nesse mormaço
Deste fumo foi-se um maço
Dessa quentura ebulindo
São emoções se bulindo
Tudo vindo de magote
E enquanto não chega o mote
A gente vai só sentindo


Camila -

Não vendo caminho em nada
Me misturo na paisagem 
Um oceano sem margem
Feito tinta derramada
Cósmica e empoeirada 
Parece que tô fugindo 
Mas no fundo eu vou seguindo
Do tempo sou sacerdote 
E enquanto não chega o mote
A gente vai só sentindo

Maria -

Meu coração está fundido
Na partitura do agora
no estilhaço da pólvora 
Acelero o tempo ido
Tempo-mãe! Tão desvalido
Explodindo a criatura!
Faço versos na tontura
Imaginar resistindo 
Enquanto não chega o mote
A gente vai só sentindo

Graça Nascimento -

Ou mote pra não chegar
Ou dias de espera vã
Um milagre é estar sã
Nessa loucura de estar
Mas é tempo de esperar
E o tempo vai definindo
E todo mundo vai indo
Dando e sentindo o bote
Enquanto não chega o mote
A gente vai só sentindo

Lu Rabelo - 

Que momento esquisito
O Brasil tá amargando
Com um vírus sufocando
E um mostro no apito
Aqui dentro tem um grito
Que tá quase eclodindo
Vem do meu ventre subindo
Já tá chegando na glote
"Enquanto não chega o mote
A gente vai só sentindo"

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

fora da caixa

Fora da caixa
Dentro da caixa
Ainda tento em vão
Me encaixar
Não acho o bloco
Que liberte
Guardo tudo
Na caixa
de brinquedos
Ainda em vão
Tento ter lugar
Ser aceita, ser perfeita,
E encantar...
A receita falha
Falta aquele sal
O sentido especial
tão discreto
que perceba
e não comente
Falho novamente
Salto da caixa
Brinquedo estranho
Feito um arremedo
Abro meu segredo
Não me acanho
Me iteiro
No chuveiro
Nem box nem ribalta
Água que ressalta
Pranto que escapa
Tomo banho
Fora do rebanho
Dentro da caixa
Fora da caixa
A gente se acha

sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Saudade triste

“É triste sentir saudade
Sem poder dizer de quem”
           (Mote de Dedé Monteiro)
 
 
Triste demais a saudade
Quando não tem cabimento
Cai logo no fingimento
Pra não cair no alarde
Mas o fogo aquece e arde
E é relativo a alguém...
Vira um mal o querer bem
E a gente se descaminha
Saudade fica sozinha
Sem poder dizer de quem.
 
Tem muita gente que sabe
Por me ver assim chorando
Que em meu peito demorando
O amor dele inda cabe
E mesmo que se acabe
Num é da conta de ninguém
Essa saudade de alguém
Jamais direi que definha
Porque a saudade é minha
E eu não vou dizer de quem.
 
Hoje estou silenciosa
Querendo respirar mais
Mas um suspiro se faz
E teu nome vem na glosa
Poesia amistosa
Soletrada no desdém
De cada gesto, refém
Mistério essa amizade
É triste sentir saudade
Sem poder dizer de quem.
 
O que não deixa dizer
É o orgulho que mata
Contrário do que retrata
Dizer é orgulho ter
Se não há o que fazer
Se um remédio não tem
O jeito que fique sem
Na voz da precariedade
Embebida de saudade
Sem poder dizer de quem.
 
Queria telefonar
Dizer o que estou sentindo
Mas sempre acabo mentindo
Quando invento de falar
Melhor é mesmo calar
Decretar certa mudez
Afirmação ou talvez
Já não tenho mais idade
É triste sentir saudade
Sem poder dizer de quem.

Saudade dor que demora
Distância que nos imprime
Faz parecer que é crime
Querer-se uma melhora
Mas quando a face não chora
Sem amar ou querer bem
Indiferente e aquém
Rogamos por piedade
Saudosos de ter saudade
Sentir e saber de quem

sábado, 8 de agosto de 2020

o sonho de uma poeta no mundo pós pandemia


O sonho da poeta
no mundo pós-pandemia

Na navegância do lar
enlevo meu pensamento
ultrapassando o cimento
substancio o cantar
E o futuro, qual será
é a questão do presente
quê plantio é consciente
quê semente vai vingar

Busco conselho lunar
tento no caos esse alento
tudo passa feito vento
isso também passará
É mister profetizar
esse porvir que impera
ouvindo a voz do que era
partindo à um não-lugar

Os olhos soltos tilintam
achando esse imaginar
ato de ver e criar
antever quadros que pintam
e espelhos que reflitam
moroso pestanejar
memórias à velejar
esse aqui que é além
imaginando o que vem
na esperança de chegar

Vejo um futuro ideal
pós a peste, a bonança
podem correr as crianças
não há doença que reste
foi-se pra lá todo o mal
E o hiato abissal
que no passado cabia
parece que não se via
desavessou-se o umbral

Para cada índio morto
nasceram muitos por vez
e pra cada não-índio torto
sumiram-se suas rês
A fauna reentendida
a natureza louvada
nós, bichos, nos entendemos
a Terra é nossa morada
E essa mãe que nos une
refez nossa caminhada

Aquela febre fornalha
que a gente alimentava
com água e álcool, baixamos
menos gazes para os planos
mais externos da esfera
Aprendemos a espera
nossa agonia acalmou
e aquele aquecimento
parece, solucionou

Sabem os povos quilombolas
remanescentes de lá
ainda estão por cá
não conseguiram tirar
da resistência esse povo
quanto a isso também louvo
pois só o bem vou louvar

E todas as lideranças
que foram assassinadas
contam, na pós-pandemia,
voltaram reencarnadas
e que com meses de vida
já se erguem bem animadas

Os que teceram maldades
melhor não citar nenhum
contam que passou um vento
que tinha odor de pum
de um palhaço gigante
que tinha feito jejum
Levou todos pelos ares
sendo o palhaço gigante
o vento também foi grande
foram parar em Antares

Sabe a soja, evoluiu
dizem ‘destrangenicou’
voltou a ser só semente
nas mãos do agricultor
virou somente "crioula"
viçosa, cheia de amor

O gado ficou selvagem
esse causou muito dano
em manadas se juntou 
não quis mais o trato humano
quis ser livre e viver
sem curral, cabresto, ou dono

Messias não teve mais
no mundo pós-pandemia
nem corona, nem coroa
De falsos Reis ou rainhas
o povo não precisou
mais dessas coisas todinhas

Cada qual na consciência
ligades com o total
sabides, conectades
à um presente real
vivem em tons mais anárquicos
em contexto mais igual

O mundo pós-pandemia
é feito São Saruê
dizem que é muito bonito
gostoso da gente ver
tem artistas e poetas
pelas ruas bicicletas
já reportou a TV

E a TV que é aberta,
pública, democratizada
não publicita igrejas
e nem elege furadas
sem concessões concedidas
por troca indiscriminada

Se é verdadeiro esse mundo
que acabo de escrever
só descrevo o que vi
e aos outros faço saber
que todos possam chegar
e esse presente viver

Nada que disse é mentira
não gosto de fake News
Foi a tal notícia falsa
que desgraçou o Brasil
Quanto a isso tome nota
que cá na pós-pandemia
vem primeiro a saúde
depois a economia
na comunhão das fortunas
vivendo o dia a dia

E para finalizar
agradeço às presidentes
pois cá na pós-pandemia
já tem outrxs diferentes
tá tudo muito mudado
cada Nação forte igual
e a nossa nova bandeira
já é plurinacional
cada povo é respeitado
tendo por lema o cuidado
a comunhão é geral
 
Assim vocês se animem
que o futuro é melhor
vão poder sair das casas
do amargoso jiló
da saudade dolorosa
e dar abraço quisó

E o sentimento enlutado
foi luta desde o passado
desde de que principiou
aqui, agora, presente...
semente que prosperou!

quinta-feira, 6 de agosto de 2020

a gente segue criando

A gente segue criando duplos
Entre o real e a imagem
contrastes, contornos
Espelhos falseando lagos
Águas beirando margens 
Agostos emergindo nos corpos
cheios de lua líquida
Úteros abarrotados de tordos
serpenteando desencontrados
Um ninho disforme no ãmago
surge revivendo mudas
Sorte acolhendo os claustros
nos seios secos das ancestrais
Todas elas e seus contrários
Muito dentro, no mundo das seivas

terça-feira, 7 de julho de 2020

Nuvem

Nublada
Raios que borbulham
Flexas, setas, direções
Cavalgo o rio insosso
Limpando o insalubre
Lugubre o piso
que o intetelecto tenta encerar.
Ouço os chocalhos vindos do céu
me desaba na idéia
Não soluço soluções
Apegada ao curto jardim que sonho
Amplo sentir destampa a palma
Abri os olhos, e finalmente, a alma goteja
Abençondo as sombras
Nuvem ainda
Paira ainda
Sem mover aparente
Constelação nebulosa

sexta-feira, 5 de junho de 2020

poema pernanbucano

O açúcar desce amargo
Desce indevido o vitamilho
Engasga o café São Braz

Sumo passado no cuador
Moído, o cheiro é de gente
Pobre preta oprimida

O suco amargo
O confeito feio
A cria desencarnada

Não tem verso que comporte 
Nem palavra que conforte
O sentido desse elevador

segunda-feira, 4 de maio de 2020

imagem

Será que você
Já viu um dia a sua imagem
Correndo livre muito longe (repete)

Será que morte ou só passagem
Será que sonho, ou só miragem

Será que você, correndo livre, muito longe
É desvario, alma que foge

Silêncio, rio, horizonte
Calor e frio, ou luz de norte

Será que vou ser
Força de esgarçante de Jaguar
Onça parente secular
Avó serpente estelar

Será que você
Corrente ou rio, trás dos montes
Meditações, fluxos, fontes
Renascimentos retumbantes

Será que voz ser
É Deuses Deusa universal
Estranha soma social
É coma, Roma, vírus, mal
Ou só o Sol seguindo e tal

Será que não ter
Já quer dizer algo melhor
É não ter medo, e não ser ser só
Um arremedo do amor

Será que vou ter
Que aprender a ser mais um
Parte de um todo, de um jejum
Um monge esquivo, um tao, um bum

Um blues, um negro, um buraco
Divina, ou china, um sobressalto
Morcego, rato, um substrato

Cabe num prato
Passe a colher
Limpe com álcool
Seja mulher

Será que você... (refrão)

nave-carroça

Vai o meu carro sem rodas
Um anjo torto, um querubim
Pelo dia amarelo
Na luz suspensa de um jardim
Uma rosa em giro
Um passarinho, um cantador
Sábio violeiro
Tocando as dores do amor

Vai o meu carro de vento
Na amplidão, sem ancorar
Um navio flutuante
Reinventando o alto mar
Sem prumo, sem leme
Roda gigante seu timão
Barco flutuante
O almirante o coração

Vai tapete encantado
Na retidão do horizonte
Flerta mil e uma noites
Mais uma história neste instante
Tem uma cidade
Um reino, um sitio, um castelo
Uma fortaleza,
Uma esperança, um paralelo

Vai carroça dissonante
Cavalo baio, pangaré
Um camelo, um elefante
Um bedoíno, andando à pé
Vai carro volante
Feito as folhas no cordel
Verso inconstante
Poesia solta sem papel

Vai a nave bicicleta
Monta na lua e leva alguem
Vem de longe como seta
Traz boa nova e neném
Grave e redonda
Som de uma outra estação
Pousa, aporta, planta
Um pensamento, um avião

Vai a casa num tornado
Tormento, bardo, um baião
Dança pelo céu nublado
Espera tempo, vôo balão
Sonha colorido
Caminho todo é esse aqui
Vai fica comigo
O que revoa não tem fim

Pelo céu afora vai...


domingo, 24 de novembro de 2019

poema tetríco

Poema tétrico
Podia ser retórico
Podia ser histórico
Podia ser empático
Poema tétrico
Podia vir histérico
Podia ser telúrico
Apenas ser estético
Mas é poema tétrico
Antes de ser apático
Entrar pelo automático
Medrar por soar patético
Poema tétrico
Que não é prático
Que se tenta cético
Perde de ser satírico
Permanece estático
Poema tétrico 




segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Corpo e sopro

Corpo
Sem sopro
Arremedo

Carne
Sem pulso
Será sossego?

Do descanso da morte
Se tem medo

Quem sabe
Se vai tarde
Ou cedo

Na vida e na morte
Há quem meta o dedo

E quem desvende seu segredo?

Entra no trem
E deixa um agrado

No mundo da vida
A ida é personagem
Veste a viagem
Essa túnica final

Pro mundo da morte
A gente se despe
De toda auto-imagem
E solta as mãos
Da pele animal

A despedida é Una com a vida

E despe a lida

De qualquer verdade
De qualquer mentira

Do corpo
Casca
Descasca

Que não é pedra
Que não é pau

Mas como se fosse fica
Corpo coisa sólida
O que era
Água viva

Corpo sem sopro
Vira escremento
boneco sem vento

que vence
E fede

Sobe o sopro
Fica o corpo

Tronco oco

A ida leva o sopro

Gás que escapa

E aqui fica a capa

Das venturas, dos desventos

Das ilusôes, dos inventos

Desvenda

Escapa

Corpo fica vendido

Só o tempo compra

Essa última valsa 

sexta-feira, 19 de julho de 2019

Veias da Terra

Quase nos tiram nós
de nós mesmas.
Quase...
 
Investigo-nas,
nós mesmas.
Minhas velhas,
nas minhas veias

Quando nos fizeram rivais?
Quando nos fizemos rivais?
Umas das outras...
Panteras contra lobas,
onças versos raposas,
vacas versos touras...

Em que lua deixamos de lunar? Reconhecer nossas avós, bisavós,  tataravos?...
Em que data longínqua essa voz primeiro nos faltou, e ecoa esse nó na gola,
de espartilho no ventre?...

Quando nos perdemos no caminho? 

Será que nos perdemos?

Em quais gestos nosso pulsar permanece, essa potência, nossa alquimia?

Eramos Amor e dançaram-nos
entre brasas.
Nos fizeram duvidar de nosso fogo,
nosso brilho, nossa luz.
Quiseram destruir nossas conexões
Nos ataram, nos atearam fogo
e nos dissolveram

Como fumaça, pranto da terra
Subimos às nuvens e desabamos.
Fomos nuvens e caimos,
retornamos

Lavadas e lavando

Lavandas, capins santas
lanceadas, cheirosas, embebidos...
Embebemos a terra de nossa força, das nossas águas...
Cimo partes, gotas dela, nos sabiamos

Somamos, somos, milhares, mulheres da materia mineral, gemas apedrejadas da terra, soma da mãe

No magma fervente nos encontramos
Vaporosas, depois vivazes e viçosas ... Criamos sobre as águas novas terras. Apesar da nossa dor, criamos

No encontro, nossas metamorfoses nos mostravam vária, aspectos da mesma.

E infinitamente vamos renascendo, remanescendo...
E dando as mãos

E Cada vez que cada mão de encontro acolhe a outra, leva,
e leve a roda firme flutua

Gira redemoinho de água
e mulher moída move
E renova

Encontro santo, somos ela,
fêmea velha

Carnes, pelos, ossos,
A morta que sempre revive...
Seios, sêlos, elos, sangues.
Energia vermelha
que lava e adentra terra,
Rama, rio, veia.
Velha viva que nos remoça,
Sábia velha que nos encanta
E a cantamos assobios


Que nos faz sábias e sabiás

terça-feira, 16 de abril de 2019

Voz

No dia da voz
ensaiamos
muitas conversas
Experimentamos
olhares, gestos, gemidos
Balbúcias, risos,
tons sortidos,
Silabas, besouros,
cantos destemidos...
Na noite da voz,
Há voz
E na calada da noite
ela descansa
Entre os santos, sonhos,
meio mansa
O mar ondulante avança,
ululante remansa
no verso da criança...

barco, cria , dança

Mareja outr bom tempo

domingo, 14 de abril de 2019

Minha vida na feira livre

Há cada verso falso
Palavra chula
Devo silenciar

Não um silêncio falso
Não um silêncio chulo
Mas um silêncio inteiro
Mergulho
pela metade
Neste incômodo
refrão que algo liberta
quando observo
letra aberta

O conteúdo desendereça
A intenção desinteressa
O sentido devo observar
E respirar calada
a letra perdida
Me encontrar nela,
compreendê-la
Liberá-la,
não sê-la

Aquela
que incomoda

Na resignação verdadeira
Conversar com portas
Com miolos de pote
Com arvoredos
Com canecas de chá
Com crianças que ainda não falam

A linguagem normal nos limita
Com suas formas omissas
Com suas normas, premissas
Não houvesse palavra chula
Verso ralo, macho o ó
A vida era melhor

segunda-feira, 8 de abril de 2019

Balão Branco

Relógio parado
Maçã distraída
Despedaça aos dentes
Do pecado sem perigo
Tripula o tempo, transita
Potência decola sementes
Terra pouso abrigo
O que medra morre
Ao medrar escorre
Ao correr decorre
O trigo que intriga
E cala a boca rama
Que vaia Roma
Contrario engole amor
E o silêncio devora as transgenias
Ávida nua se desola
Faz a maça de bola
E degola
O branco balão do pensamento

domingo, 3 de março de 2019

Bicho

És bicho rasteiro
Na posição da serpente
De repente muda
E és barca graúda
Na proa do mar

És minúsculo grilo
Com visíveis músculos
Abanando os pés
No mesmo lugar

Em sono acordado
Serena e se enrama
Pra tudo que é lado
Passeia na cama

Preparando o nado
Feito fio de rio
Sonhando pelado
Sem sofrer o frio

Bicho que contempla
Calado levanta
Trotando besouro
Lábio, voz, garganta

Canta, ave santa
Sem sequer falar
Reza o som do "m"
De mamãe e mar

No entoar sereio
Ondas e tritões
Sons universais
Mil religiões

Grita outros refrões
Perseguindo esferas
Tem flores nos lábios
Sábios, primaveras

terça-feira, 25 de dezembro de 2018

Vida real

Pequeno fluxo de ostra, ostra real
Teu toque desinteressado
Missa campal, de salto
Ex que olha esquisito
Vida brega com esmalte nude
Jovens pela praça
Brasileiros de graça
Pedindo canção
Amanhã peço socorro
Amanhã esqueço o pedido
Pastor de ovelhas
Cria de costas pra igreja
Corpo inflamado
Mama inflada inflamada
Mama mole
Mama de uso
Mama real
Vida vestida brega
A natureza chamando
Cabelo de fogo louro
Mate suco de manga
Boy metido a merda
Boy maconheiro
Marido é brega
Companheiro é massa
Pão é massa, mas me inflama
Açúcar da carência
Buceta costurada
Buceta real
Osta de pequeno fluxo
Ostra preciosa
Vida real
Ostra real
Vida-ostra real

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Mar que se quer

Como quem não quer nada
O mar infiltra as construções
Em trêmulas contrações
Sua força

Janaína anuncia que chega
E silencia

Como quem não quer nada

Como quem nada quer
Nada onde está

O mar se aperta feito sardinha
Dentro de ventre se aninha
Na nave mãe

Como quem não quer nada
quer sair sozinho

Beber leite,
Tripular colo,
Aprender os planos
Caminhar solto

Como quem se quer

Rasgo

Rasgando...
Assim chegaram as crias
Uma, meticulosa,
quis que o rasgo fosse exato;
Outro, aberto,
Se sabia rasante.
Pleiteou um rasgo espontâneo.
Ambos me sangraram
Como sóis nas madrugadas
Ou luas novas em fins de tardes.
Sutis nem tanto
Serenos nem tanto,
Mas vindos da graça
das manhãs de Ñanderu.
Verde pedra no brilho do rio,
Neblina leve na areia do mar...
Cortando vento
As crias silveatres se chegam.
O vento nos guia
Em corpo terra
Casa curiosa de carinho
Corte, costura
e rasgo.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Corujita

Minha corujita,
No alto, com brancas plumas
Fazendo ninhos nas grandes vigas
Entre as falhas da coberta
Fazendo telhas com os olhos de proteção
Cadê teu sonho no inverno
Teu verão real
Estamos no tempo de teu vôo
E o tempo é nosso linho
Aqui costuramos o veio
Saberes simples
Mãos na penugem
Afago no presente
Minha corujita me afaga
Ela é a melhor carícia
Corujita elétrica
Quando dorme encontra a água
Uma menina terra
Em tempo de corujita
Estala a língua
chão de lua
Bico de alimento
Tento espelhos nos teus olhos que me fogem
Mas no teu respiro encontro a paz, a verdade e a essência
Encontro nos meus olhos
mãe e coruja

sábado, 12 de agosto de 2017

Sidmar

Coisas de casa
que se usa e abusa
Comidas, cômodas,
temperas, temperos.
Adolescências e casais.
Família tamanha, tamanho família.
Manhãs e ciganos
Cafés, pias cheias, luas meias.
Tormenta de cães
Verdade imantada.
Vinhos, flores, luzes
Ação,  consagração
Vida em alta definição.
Coisas que quebram e consertam
Caminhos que se cruzam
Na contra mão.
Desapego se aprendendo
Palhaça, palavra
Parole parangole
Filmes que não vi
Baixando aqui
Internet s
Sentido... que?
Silêncio
Orgânica
Organela
Organismo
Organização
Higienização
Desapego...
Quem somos? Que?!
Amoras. As infinitas amoras da estação.  Da temporada.  As roxas do verde, as roseadas azedinhas.
"Nomade" - com esses olhos so podes mesmo ser esse cigano, Sidmar.

24.02.2011
Várzea
Recife

quarta-feira, 3 de maio de 2017

Lua gestante

Expurgar o que guardam peito e músculos.
Coração do mundo chove
Medo pede paz
Legítima raiva pede paz
Amor pede paz.
As chuvas da grande mãe consolam, acarinham, refazem
Nublado o olho do céu, adensa a atmosfera.
Pairam e revoam chorosas aves.
Resvalam.
A noite azul, marinho, cobalto.
Cristal de lua forte, oscilando,
Sumindo...
A lua olho
Espelho soma
Lua gesto
Algo restante
Alga, alma
Gestante.

Quarta feira,  13.04.2011 - Casa Forte, Recife

Noite agaloada

"Eu sou o céu para as suas tempestades.  Rainha dos raios... tempo bom, tempo ruim" (Gil)

Noite vermelha
Rua alagada
Água marrom
Chocolate rio
Navegancia tremenda
Ganância de movimento.
Te aquietas pessoa
Lagoa que se põe
Na tua ilha há um q familiar
Tuas fotos nas paredes
Redes
(Navegancia tremendo)
O tesouro acordado...
O corpo barco
Bardo que pulsa e dorme.
Na tua ilha tudo nada e volta
Ao redor e aqui
Navegancia tremendo
Calor no sentido
Na turva ilha ilha libido
Barca na rua sonhada
Caminho de água
Rio vermelho telha
Marrom terra
Água chocolate
Entranhoso cocô
Noite alagada.

2 de maio de 2011, Várzea

( li essa poesia hoje e sincronicamete fazem 6 anos dela)

domingo, 24 de julho de 2016

Mãe diz


Mãe diz que ela vai dormir
Ma diz que ela vai naná
Mãe diz que ela vai subir pro céu
Num cavalo marim do mar

Mãe diz que ela vai nanar Nanã
Nos braços de Iemanjá 
Mãe diz que ela vai subir Iansã
No raio do clarão de Oiá

Mãe diz que ela desce já
Mãe diz que ela vai correr
Mãe diz que ela vai correr no rio
No ouro de Oxum brilhá

Mãe diz que ela vai correr
No mato verde de Ewá
Mãe diz que ela vai subir
Cavalo da guerreira Obá

Mãe diz que ela desce já
Mãe diz que ela vai correr
Mãe diz que ela vai correr no rio
No ouro de Oxum brilhá





quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Carta ao Lobo Mal

Sr. Lobo Mau,
Em estado de maldade te encontras, mas não és isso. Se dentro das vozes e imagens que te perseguem conseguistes encontrar o silêncio... Consigo ver uma massa condensada de ausência. Que na tua história te foi negado? A ti, a teu antepassado? Que maldição te recai e vestes? Precisas chamar atenção, mas te escondes. Teu mal te remonta a milhares. Que engano esse teu. Limbo. Pedes a morte, o estupro, a moça, a velha, os porcos brancos... Busca agonísticamente o feminino que a sociedade te negou? E desejas sem limite tudo que te falta, e feito bicho raivoso vais devorando o que não compreendes. Devora, esquarteja, atropela, cospe, esfacela, degola, engole, devora. As moças, a velhas. As pretas, branquejas. As travas, sapatas, as bibas, as bambis, Aquelas. Todas. E a teu segredo o que agrega? Num segundo, nem sabes; lambes o ouro, o carro, o louro. A inveja intensa de cada porco branco que se esconde em sua morada segura. Com cerca elétrica, arame, alarme. Em "suas terras", patrulhada de cães... Ou és aquele lobo branco armado, perdido nos ódios do tempo, mostrando a carta que paira nas bocas dos velhos vencidos, herdeiros do orgulho branco escravocrata que reluta se envergonhar do feitos. Ou o torturador, devorador de si e do outro, se abrindo nos arquivos. Que tipo de lobo és? Que de tão mau se encerra? Aquele que erra? Aquele que era? Vejo tuas mãos finas e transparentes entregando crianças negras a teus parentes pra caçar crocodilos... Esse engasgo, esse engodo. No lodo das raízes que saltam, nas chapeuzinhos que saltam, nos porcos, nas ovelhas, nas velhas xamãs... Cada índio, negro, lobo, selva, terra... Cada mulher, negra, branca, indígena, cugana, cada mãe, cada bruxa... Que tua espada, arma, fogueira, bomba... Comeu.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

sereia ouriço

então saio daqui
agradecida e com as malas buenas
llena de leche dulce
socorrida do real amargo
saio na hora de rever as avenidas
com um coração nos braços
no peito, pulsar de fungados
colo um ser, inteiriço 
sereia ouriço





quinta-feira, 21 de agosto de 2014

parto e filha

parte de porte
forte parte que une
partida
partilhada
compartida
barriga compartimento
sentir que religa
briga, consentimento
ressentimento e instiga
que compartilha
pequena ilha


sexta-feira, 1 de agosto de 2014

escorpião

Oh, quantas flores de Aldebarã queres no jardim
Quantas touras, morenas, louras, queres ferrar

Língua enrolada essa da poética enrroladinha
querendo rolar querendo rolar

Avoa avoa, passarinho
 acha teu ninho no Amapá

Atoa atoa, coitadinho
buscando coito noutro lugar

Mil e uma as estrelas de Aldebarã luzindo
nos teus olhos perdidos
de ilusão constante

Mil e uma noites desperdiçadas 
de fundida espada
Solidão cortante

Começou uma guerra fria
Guerra do fogo acabou

Gerando a luz de Luzia
Não devo tempo nem nó

Fadas queres segurar cintura
arrancar as asas na tortura

Abelhudo, zangão, afim de militar
em todo batalhão,

Em todo angar, afim de pousar

Não te culpo, lobo lupo
mamífero secular

a fim de mamar
a suma volúpia
noiva nova nupcia
de descaminhar

Vento volátil uivante
afim de amante
de cunho galante
de galo cantar

Mira tanta estrela, o escorpião
de constelação

Estuda tanta rota, que já não lhe enxota
o jovem ferrão

A fim de ferrar, a fim de ferrar

terça-feira, 29 de julho de 2014

revolta das fadas

Ciúme e raiva de todas essas falas escritas, mágoa
Das aberrações descritas, monstros de dígitos
A transa, a tara, a panela de pressão
Toda essa literatura interna, escondida,
Cheia de palavra ruidosa pompando a erudição
Pra colher verde, pra colher maduro
Pra se sentir

Estais preenchido? Tua alma, teu umbigo?
O mal duro agora quer se expandir
Como teu peito pretende se abrir pra raiz
Como tua transa ensaia duas na madrugada do virtual

Assim engulo teu gozo como engolindo teus sapos
Guardo teus sapatos como guardas teus segredos
Com vergonha que me descubram te guardando

E fica na falha tua vitória entendida e disponível
E meu drama sem pra quê nessa altura do torneio, da tourada
Beirando poema bélico e pensando na palestina

sexta-feira, 25 de julho de 2014

dicionário de mãe ebulindo

ovo ovo ovo
vale de ovos
vivos ovos
maturando dentro

uivos, calos
meus cavalos
segurá-los
mastigando fenos

leites leites leites
humanos azeites
penas e deleites
gomas e unguentos 

gentes gentes gentes
buliçosas gentes
novas e crescentes
procurando centros


chuvas e serenos
pejos obscenos
porcos lameados

natureza bruta
bolsa rota enxuta
xotas esgarçadas
 
 ...


domingo, 4 de agosto de 2013

tortuguita

cada uma pessoa que mora
espécie rara no corpo
lembrança viva se povoa o corpo
cada pessoa que funde casco
finda divisão e fica corpo
no sutil misturado corpo
plena amizade de tempo
finda morte e se infinita
alma mora na distância do piauí
junto do encontro amplo
distância sempre distrai
e o querer vira um detalhe besta
com cara de tortuguita marrom
e o bem querer, detalhe bom
é desapego secular
com cara de idoso zen

quarta-feira, 31 de julho de 2013

oração do cotidiano



Paz do cotidiano, me acha
Amor do cotidiano, me toma
Coragem do cotidiano, me acorda
Solidariedade do cotidiano, me ensina
Arte do cotidiano, me apropria
Salmo do cotidiano, me liberta
Verdade do cotidiano, me irrompe
Selva do cotidiano, me fortalece
Semente do tempo, me renasce

sábado, 27 de julho de 2013

amor

a quem recorrer?!...
pensei em matar, pensei em pular, pensei em morrer
pensamento é só, pensamento
no tempo pendular, uma ansiedade de ser, algo
coisa

calma, mira, calma..
calma o que?!
calma falha desalma

corpo me desperte
raio de raiva
ilusão de medo

caminha, corre, varre, morre
descarga escorre
amor socorre