Javali, javari, jauari
Estava eu dentro daquela construção onde passei a infância
no sertão, usina velha, lidava com algodão... Entre destroços, alvenaria antiga
e uma selva erguida. De repente surge um javali grande, destes mágicos que
falam e a gente entende. E depois de dizer uma porção de coisas sérias sobre
vida, corpo, território, presença, destino; me desafiou na força. Olhou fixamente e veio até mim em carreira,
abocanhou-me a orelha esquerda, babando os cabelos. E sabendo eu que era
necessário estar imóvel, com perigo de partes contidas na boca do bicho,
mágico, que me ensinava algo. Algo de sobrevivência e luta, e algo além. Algo
sagrado, porem palpável, talvez não capaz de segurar. Algo vermelho terra, como
um sopro quente além da raiz; algo ancestral da feitura das gentes de carne,
essas que passamos a ser, e ao pouco também fomos esquecendo que somos.
Encontrei um rio e uma luta de cá, e um milagre na Índia.
Aos poucos vou desvendando os símbolos que despertam quando durmo, que dormem
quando desperto, que despertam.
Na casa de vó Regina, um portal, e vozes que aconteciam,
vozes de bruxas antigas, como num rádio antigo pegando frequências mortas. -
Não as escute, melhor você não fazer o que elas querem – eu temia esse
desconhecido feminino que não podia ver ou ouvir, mais do que temia o Javali
que me atacava.
Em outro ambiente grandes torres vazadas, pálidas,
piramidais. Danças modernas, hipnóticas, vampirescas. Quis sair daquele lugar.
Descia rapidamente as galerias, brancas, pálidas. Algo mediterrâneo. Aldo
desértico. Propaganda de malboro. Pessoas alienadas, ou apenas festivas. Elas
não sabem que logo serão mordidas, sugadas... tudo muito perigoso nessa região
da mente do Arizona, Novo México, ou sertão.